domingo, 13 de novembro de 2011

Livros me dão náusea 24

Tentando ler O Filho Eterno, do Cristóvão Tezza. Final de ano, período de provas, tudo que consigo ler são as redações dos alunos.
Por isso não consegui postar a continuidade de "Urubu".

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Urubu

Quando cheguei ao meu quarto vi, em pé, ao lado da cama, um enorme urubu. Daqueles que a gente vê no céu, percebe que é grande, mas não o quanto. Fui andando devagar para trás, olhando nos olhos do bicho, morrendo de medo que acontecesse comigo o mesmo que com o personagem do conto de Kafka. Já imaginava o urubu descendo pela minha garganta, bicando minhas entranhas.

Consegui ultrapassar de ré o portal do quarto e, bem devagar para não atraí-lo, cheguei à cozinha. “Pelo amor de Deus, tem um urubu na minha casa”, disse ao porteiro pelo interfone. “Tá cheio de urubu aqui por cima, a senhora não devia deixar a janela aberta”. “Meu senhor, preciso de ajuda, não de conselho”. “A senhora espera um pouco que eu vou chamar o zelador”. Chama a Nasa.

Esperei o zelador com a porta aberta. Não para recepcioná-lo, mas para fugir, caso o urubu se manifestasse. Será que ele já não saiu? Será que ele andou até a sala? Ou voou?

Quando o zelador chegou fomos até o quarto, eu, atrás dele, com a vassoura na mãe. Ele de lanterna - não sei por que, estava de dia- e um pedaço de pau. O homem estava aterrorizado, mal pôs a cabeça pra dentro do quarto e já foi dizendo: “Ih, dona, o bicho é grande demais, não dou conta sozinho, não”. Já sabendo do perigo, o urubu havia ampliado as asas, mostrando sua envergadura multiplicada por dois. Chamamos o faxineiro e, pra garantir, o sindico.

Agora éramos quatro a entrar, pé ante pé, no quarto. Nesse momento o urubu deu apenas uma batida com as asas e alcançou o teto do quarto. Começou a se debater, voar em círculos, dar cabeçadas no ventilador de teto enquanto o faxineiro e o síndico tentavam agarrá-lo toda vez que batia o corpo contra o teto e esse movimento o empurrava para baixo. Nesse sobe e desce eu já tinha perdido a voz de tanto gritar e do zelador nada mais se sabia.

De repente o síndico, que era um senhor bem atlético para a idade, subiu na cama e deu um pulo sobre o urubu. Conseguiu agarrar seu pescoço. Com um esforço enorme dominou o bicho, sem conseguir evitar ser ferido por suas garras e bico. Durante a luta corporal o urubu regurgitou seu putrefato alimento e com essa forma nojenta de defesa contaminou meu colchão, meu ar e a cara do síndico.

Nesse momento, o faxineiro ajudou o síndico e os dois apertaram o pescoço do urubu com tanta força que o mataram. O síndico sujo de vômito de urubu e o faxineiro ficaram ali no meio do quarto, bem onde vi o bicho pela primeira vez, com seu cadáver na mão. E eu no portal, pensando em nunca mais entrar naquele cômodo.
Os dois levaram o urubu morto. Fechei a porta do quarto e chorei a tarde inteira no sofá da sala.

                                                                       ***

Robson chegou à casa do seu primo do outro lado da cidade escondendo a arma, embora soubesse que seus parentes conheciam o teor do seu trabalho.

[continua]

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

livros me dão náuseas 23

Os da minha rua - Ondjaki
Do fundo do poço se vê a lua - Joca Reiners Teron

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Livros me dão náuseas 22

Carvão animal - Ana Paula Maia
O coração às vezes para de bater - Adriana Lisboa

sábado, 27 de agosto de 2011

Livros me dão náuseas 21- extended version

Acabei de terminar o Por que sou gorda, mamãe? da Cíntia Moscovich

Cíntia, seu livro para mim foi um romance de ficção meio autobiográfico, pelo menos me fez pensar assim. Tanto que a identificação foi imediata. Em dieta desde os 12 anos. Comendo comida chata de períodos em períodos da vida. Odiando a academia de períodos em períodos da vida. 

Assim que o livro foi lançado tive curiosidade de ler, Cíntia. Pelo conflito com a mãe, pela narrativa dos antepassados judeus e pela herança obesa.

Comprei o livro assim que soube que iria ter tempo para ler. Comprei e logo comecei a ler por todo canto: intervalos de aulas, ônibus, restaurantes e até mesmo em casa! Sabe, Cíntia, em momentos não gostei do livro. Não achei sua melhor obra. Por vezes tive certeza de aquela era você, sua história, nua e crua. Depois percebi que era você, mas só na emoção. A identificação era a mesma que sentiria qualquer uma que estivesse e/ou fosse gorda (ex-gorda, tivesse medo de ser gorda etc). Torci por sua perda de peso a cada capítulo.

Por dois momentos me senti o paradoxo obeso: li seu livro comento pastel de belém na Casa Cavé. Li seu livro comendo torta de chocolate da Lecadô. Com capuccino da primeira vez e apenas com um copinho d'água na segunda. 

Torci para que não estivesse aparentando ser muito gorda, às vezes a gente escolhe as roupas erradas, você sabe, Cíntia. Tinha aquela sensação de "olha a gorda lendo livro pra emagrecer e se entupindo de açúcar". Mas não dá para evitar. Também tenho antepassados famintos e o olho maior que a barriga (como o Menino Maluquinho). Então me lembrava de que aquilo era literatura e que se danassem aqueles que estivesse pensando que seu livro era auto-ajuda, livro de dieta, a lei da atração pra gordinhos. 

No fim das contas, talvez seu livro tenha sido até mesmo uma homenagem ao gordo culpado e ele merecesse ser lido diante de porções de açúcares, carboidratos, gorduras, pornografia, e todos os outros crimes que ingerimos.

Sabe, Cíntia, fiquei triste quando o livro terminou. Feliz por sua dieta ter dado certo e por eu ainda ter mãe e pai. Espero que a reabilitação seja o destino de todas nós e que consigamos conviver bem com a comida e com a mãe.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O florista


Entrei no ônibus junto com o moço que carregava um maço de botões de rosas amarelas daquelas embrulhadinhas em uma espécie de filó. Meio estranho, o cara. Indo vender flores em Niterói? Desconfiei. Não sentei perto dele, não dei sorte ao azar. Me posicionei de forma que pudesse ver os movimentos do suposto florista. A cidade está policiada, fazia tempo que não passava pela Brasil, muitos policiais militares – e suas armas expostas – nas beiradas das avenidas. Não sei se é bom ou ruim. Polícia na rua é sinal de ladrão né? O florista pôs a mão sob a camiseta suja. É agora. Mas ele só se coçou e aninhou melhor as flores protegendo-as do sol.

Chegamos na ponte a agora não seria um bom momento para um assalto, pois não havia como fugir. Eu desceria no primeiro pontos após a descida. Sentei mais à frente e o homem me olhou. Tomara que não toque o celular, se tocar não vou atender. Não vou dar sorte pro azar. Talvez minha mãe queira saber onde eu estou. Um homem sem braço desce no Mocanguê. O que é pior em um assalto: ônibus cheio ou vazio? Logo hoje que eu saquei dinheiro? Pensei em tirar o ship do aparelho de celular, mas não. Tirar o livro (que já havia terminado de ler) da bolsa e fingir tranquilidade. Mas não. Ele poderia perceber e se tornar agressivo. Ele estava se mexendo demais, talvez nervoso pela arma ou pela passagem por algum posto da polícia.

Se a polícia entrasse no ônibus haveria troca de tiros e eu estava muito longe da janela de emergência. Faltava tão pouco para eu descer. É egoísmo, mas torci pro florista-assaltante começar o assalto depois do meu ponto. Dei sinal muitos metros antes do necessário e fiquei em pé ao lado do motorista. Quando a porta se abriu saltei para calçada e imediatamente corri para o outro lado da rua como se o florista tivesse descido atrás de mim. Mas não. De qualquer forma, não dei sorte ao azar.

Sem olhar para trás tomei minha direção com pena dos passageiros que agora, ou mas tarde, seriam assaltados.  

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Livros me dão náuseas 20

Parque Industrial - Patrícia Galvão (Pagu) : De uma vez só, bem rapidinho.
A escrava Isaura - Bernardo Guimarães: Às vezes é preciso recuperar certas origens ligeiramente constrangedoras.
O Fotógrafo continua me dando certas luzes, muitas náuseas.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Os óculos


A natureza parecia uma manta verde bem fresquinha ao redor do corpo de Julinho. O afago das pessoas em suas bochechas também era mais suave e ele caminhava leve, leve. Depois que ganhara aqueles óculos, tudo havia mudado. Para muito melhor! Tudo bem que havia ficado um pouco mais difícil para acertar o chute na bola e, de certa forma, parecia que ele estava invisível. Todos os seres dos desenhos animados bailavam ao seu redor e a vida tinha ficado igualzinha a anestesia do dentista, só que sem agulha. Eram os óculos. Até que não enxergava mal entes de ganhá-los. Tudo parecia mais ou menos claro até que sua mãe o levou ao shopping e lá Julinho teve a surpresa dos óculos novos. Não eram aqueles de aro fininho dourado, nem daqueles que imitavam não estar de óculos. Eram azuis e vermelhos, com armação grossa que dava um peso estranho no início, e depois adaptação total. A vida de Julinho seria, agora e para sempre, completa como um sonho, pois não precisava de ninguém para guiá-lo pelo mundo. Via. E ver o fazia completo. Em seu coração, agradecia à mãe pela surpresa... Porém, a mãe, essa mesma deusa que tinha antes lhe dado o poder da visão, agora cobrava:
- Gostou do filme, Julinho? (Que filme?)
- Entrega os óculos à moça. (Que moça?)
- Outras crianças vão entrar no cinema agora. (Que crianças?)
- Não chora, filho, semana que vem eu trago você de novo.   

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Seda Azul

Ana saia na rua e que moça feia ouvia dos pensamentos dos outros. Um pouco constrangida, se calava e seguia o passo rumo ao banco, cinema, faculdade, casa. Às vezes soltava o cabelo para ver se o rosto se aninhava aos fios grossos, deixando a feiura menos aparente. Mas os tais fios grossos eram também opacos, quebradiços e muito volumosos e assim, que monstruosidade, pensavam em voz alta os passantes. E seguia o passo, infeliz de ter tantas obrigações a fazer de dia, na luz que tudo revelava, infeliz de não ter um carro (com insulfilme acima dos limites permitidos).

Na volta para casa, Ana passou em frente a um restaurante onde viu uma moça de vestido azul, coque baixo e pequenos brilhantes nas orelhas. Os outros também olhavam, que mulher linda, um coro de pensamentos opinava. Foi andando sem desviar olhar, até que virou a esquina e chegou ao ponto de ônibus. Em casa, Ana pensou na moça e dormiu...

… Para acordar de manhã e não se olhar no espelho de história infantil que denunciaria com voz maléfica a situação estética da moça. Melhor não. Ainda teria de cruzar avenidas sob insultos de pedestres e de motoristas que pensavam você não devia sair de casa! Um acinte aos olhos! 

À noite, na fila do teatro sua solidão viu a solidão de uma mulher muito bonita. De vestido azul. Era seda azul. Coque, brincos e olhares. Divertiu-se com o espetáculo e dormiu sorrindo.

Mais um dia, mais uma noite. E hoje iria a uma boate. Abriu o guarda-roupa, escolheu o que vestir. Ao chegar à boate viu uma moça sozinha mostrando a identidade para o segurança, feia na foto, feia ao vivo, disse o pensamento do segurança. Coitada, disse seu pensamento, e entrou na boate com o único documento que tinha: os olhos. Passou pelo guarda-volumes e, como não levara nada, parou apenas para se olhar no espelho. No reflexo, se viu linda no vestido de seda azul. Um pouco atrás de si, a moça feia se esgueirando entre os frequentadores.

domingo, 31 de julho de 2011

Os livros

Ela só queria ler um livro em paz. "Um dia frio, um bom lugar pra ler um livro", essas coisas. Mas não conseguia. Toda vez que começava a leitura uma angústia a dominava, parecia que um mundo de tensão a espreitava. Não era calmo. Lia. Depois deixava ao volume terminado na estante e olhava, temerosa, para todos aqueles outros ali guardados. Juntava mais livros do que podia ler. Sonhava ser devoradora. Daquelas que leem 100 livros por ano. 100 livros. Tão bonito esse número. Não passava de vinte, sendo uns cinco ou seis inacabados. Sonhava, também, entrar na história, sentir-se livre, liberta na ficção, de mãos dadas com seus ídolos literárias, vivendo uma emoção muito diferente do que sentia. E foi assim que a atração pelos livros, lindos, limpinhos nas livrarias - vibrantes nos sites das livrarias - fez com que ela construísse sua biblioteca feita de angústia e medo. Como só uma paixão interminável e talvez reprimida pode construir: um universo só seu, feito de uma coisa que só ela podia reconhecer. 

sábado, 30 de julho de 2011

Livros me dão náuseas 19

Eu voltei. 
A ler
A escrever
A postar
A respirar

Lendo: Azul corvo (Adriana Lisboa) e O Fotógrafo (Cristóvão Tezza).

Agora vai, minha gente... Agora vai!

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Livros me dão náuseas ... perdi as contas...

Estou tão em falta com meu blog, meus leitores e meus livros...
Estou lendo Minha alma é irmã de Deus, mas não consigo terminar de jeito nenhum.
Acabei de ler Só as mulheres e as baratas sobreviverão da Claudia Tajes. É uma espécie de intertexto com A Paixão segundo G.H. Só que mais contemporâneo e bem menos genial.
Estou com muitos livros novos e nem começados. Excesso de trabalho e calor dão mais náusea que os livros.
De volta ao trabalho!