sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Rádio de crente


Tem uma kombi que me leva para casa todos os dias, quase todos os dias. Uma kombi comunitária que para na esquina e espera as pessoas que voltam do trabalho. As mulheres que vão ao banco pagar as contas do marido e as avós que buscam as crianças no colégio. Elas conversam muito, as mulheres e as avós: futebol, desgraça, prefeitura, o preço das coisas. Falam muito com o motorista. Ele tem pressão alta, de vez em quando não tem kombi porque o homem se alimenta errado e passa mal. Aí a gente vai para o ponto de ônibus, ou então, rachamos um táxi, embora eu tenha vergonha de convidar alguns companheiros de condução, às vezes as pessoas não têm dinheiro para táxi. O ônibus convencional demora e dá muitas voltas. Melhor ir mesmo a pé, diz um homem. Mas normalmente o motorista está bem, conversa muito e conhece a gente. Torce pelo flamengo, como eu acho que quase todos os motoristas de ônibus insistem em fazer, e conta historias engraçadas de sua netinha. Criança é muito engraçada. É alegria do vovô, da vovó, uma gracinha. Todos falam mal do governo, da polícia, da guarda municipal e falam bem do pão fresquinho que vende na padaria do centro e do tempo aberto.

Ontem teve kombi e não havia ninguém esperando na parada. O motorista recostado, parecia cochilar. Como nunca, o rádio estava ligado. Sempre precisamos esperar encher a kombi ou dar o horário – a cada uma hora. Os passageiros demoravam a chegar e o motorista recostado compartilhava comigo e mais outra moça – ou duas – as músicas da rádio de crente. Ele não conversou ontem, nem sei se estava acordado ou se dormia. Mas no rádio eram músicas de crente. Dessa vez os passageiros demoravam a chegar e a kombi permaneceu estacionada pela uma hora certa enquanto tocavam as músicas. Não chegaram passageiros suficientes, então seguimos viagem mesmo assim. O motorista não conversou, apenas desligou o rádio quando deu a partida do carro. Acho que ontem ele não estava bem.

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