quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

A casa do lado (parte 1)

Nunca vou à casa dos meus vizinhos. As pessoas me acham excêntrica, dizem que eu devo ir ao analista, que isso é algum tipo de síndrome ou fobia que me impede de me relacionar socialmente. Mas eu me relaciono muito bem, perfeitamente, menos com os vizinhos. Tudo porque na minha infância houve uma casa ao lado.

A casa era quase igual a minha. Morava naqueles conjuntos habitacionais antigos, em que as casas, antes iguaizinhas, já tinham sido modificadas. Essa era ainda bem parecida, com um andar a mais e um quarto separado nos fundos. Esse quarto, víamos de longe, não tinha janelas, apenas uma porta de madeira e com grade por fora. Parecia depósito de alguma coisa.

Havia movimento na parte interna da casa, víamos pessoas lá dentro, homens e mulheres quando abriam as cortinas. Adultos e idosos. O estranho é que eles nunca saiam. Esse era o mistério da casa. De onde tiravam comida se não iam ao mercado? Ninguém ia ao médico, nem saía de férias. Também não havia horta ou animais de que pudessem se alimentar.

Às vezes ouvíamos som de muitas conversas na casa, como uma festa, mas sem alegria. Eu, meus irmãos, minhas amigas da rua sempre espiávamos a casa pelo muro. Mesmo compartilhando o muro, meus pais não conheciam os vizinhos. Devem ser muito velhos e não podem mais sair de casa, somos novos aqui, por isso não os conhecemos, dizia meu pai. Embora já morássemos lá há 10 anos. E eu vi, havia pessoas jovens lá também. Pela janela eu enxergava uma mulher se cabelos compridos, dois homens baixos aparentando menos de 40 anos. Eles se movimentavam muito pela casa, passavam uns pelos outros sem nada dizer. Pareciam em um trabalho incessante.

Ouvia-se latido de cachorro e uivos, mas nunca vimos o bicho. Parecia que, como os outros moradores, ele vivia confinado na casa. Pensamos que poderia morar naquele quartinho dos fundos. Mas já haveria morrido, pois ninguém nunca ia até lá alimentá-lo.

E tinha os velhos, quatro velhos, dois casais. Uma das mulheres idosas ficava na janela do último andar olhando a rua, mas o vidro permanecia fechado. Mesmo quando chovia muito, com raios e trovões, mesmo quando saíamos ainda na madrugada de viagem à praia, a víamos na janela. Ela nunca dirigia o olhar.

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